Inspeção predial é o processo sensorial de análise das condições técnicas de uso, operação, manutenção e funcionamento da edificação

O artigo anterior foi o primeiro desta série sobre as ferramentas da engenharia diagnóstica e abordou os aspectos conceituais a respeito das diferenças, finalidades e objetivos de cada ferramenta e das normas técnicas relacionadas ao tema.

Neste artigo trato das Inspeções Prediais, que são uma das principais ferramentas da Engenharia Diagnóstica, abordando as normas específicas e os procedimentos passo a passo para elaboração do Laudo Técnico de Inspeção Predial.

Os textos subsequentes desta série abordarão ferramentas específicas da engenharia diagnósticas e suas aplicações, patologias e outros aspectos. Os artigos desta série devem se intercalar com os textos das séries sobre avaliação de imóveis e instrumentos de política urbana, uma vez que tratam de conceitos interconectados que eventualmente servem de embasamento um ao outro.

Engenharia Diagnóstica: Inspeção Predial passo a passo

Sumário do artigo

Introdução

Conforme tratado no artigo anterior as ferramentas de engenharia diagnóstica são a vistoria, a inspeção, a auditoria, a perícia e a consultoria, hierarquicamente estruturadas nesta ordem. A vistoria está relacionada à constatação técnica, a inspeção à análise técnica, a auditoria ao atestamento técnico, a perícia à apuração técnica de origem e a auditoria consiste em prognóstico e prescrição.

A partir destas definições e enquadramento, notamos que a Inspeção Predial não se limita à mera constatação, mas também não tem o objetivo atestamento ou de determinação, muito menos de prescrição de qualquer solução.

O propósito e o foco da inspeção predial, no campo de ação da sintomatologia, se dá na análise técnica.

Neste sentido, podemos definir como escopo da inspeção predial a análise de elementos, sintomas e condições físicas das anomalias construtivas e falhas de manutenção das edificações, com base em informações genéricas e na expertise do inspetor, realizada normalmente através de vistorias.

Normas técnicas

Conforme também foi tratado no artigo anterior a Associação Brasileira de Normas Técnicas - ABNT, que é o foro nacional de normalização, disponibiliza à sociedade textos normativos relacionados à manutenção de imóveis e à engenharia diagnóstica há muitas décadas.

Todavia permaneceu por muito tempo uma lacuna não preenchida relacionada à análise técnica e avaliação da qualidade da manutenção e sua aplicação direta na gestão patrimonial, e a Inspeção Predial é ferramenta que propicia esta avaliação sistêmica da edificação.

Esta lacuna foi preenchida, em certo sentido, pelas Diretrizes técnicas do Instituto de Engenharia e pela Norma de Inspeção Predial Nacional do IBAPE - Instituto Brasileira de Avaliações e Perícias e Engenharia, publicada em 2009 e atualizada em 2012, com base em texto normativo do IBAPE/SP, que tem sido o principal referencial normativo especificamente relacionado a Inspeções Prediais no Brasil, pelo menos até 2020, quando foi publicada a NBR 16.747.

NBR 16.747

Finalmente, em 2020, a ABNT publica a NBR 16.747, que fornece diretrizes, conceitos, terminologia e procedimentos relativos à inspeção predial, estabelecendo métodos e etapas mínimas para a atividade e se aplica às edificações de qualquer tipologia.

Esta norma trata de Inspeção Predial em um sentido geral, que avalia as condições globais da edificação com base em uma análise fundamentalmente sensorial (que é a análise e interpretação dos elementos e patologias da edificação como são percebidos pelos cinco sentidos: visão, olfato, gustação, tato e audição), e não cobre inspeções prediais especializadas.

A atividade de inspeção predial estabelecida nesta Norma tem por objetivo constatar o estado de conservação e funcionamento da edificação, seus sistemas e subsistemas, de forma a permitir um acompanhamento sistêmico do desempenho ao longo da vida útil, para que sejam mantidas as condições mínimas necessárias à segurança, habitabilidade e durabilidade da edificação.

Enquanto não havia uma norma da ABNT tratando especificamente sobre Inspeção Predial era comum fazer referência à NBR 13.752 (Perícia de Engenharia na Construção Civil) e, para identificar o padrão de qualidade, à NBR 15.575 (Norma de Desempenho) e NBR 5674 (Manutenção de Edificações).

A NBR 16.747 faz referência a estas normas citadas e inclui também a NBR 16.280 (Reforma em Edificações) e a NBR ISO 5492 (Análise Sensorial), de modo que abrange as normas já conhecidas.

A ABNT ainda afirma explicitamente que a inspeção predial considerada por esta NBR 16.747 não tem a finalidade de avaliar os requisitos da NBR 15.575, não substitui as atividades de inspeções periódicas que são parte dos programas de manutenção conforme estabelecido pela NBR 5674, e que devem estar previstos nos manuais que são escopo da NBR 14.037.

As normas brasileiras (NBR) podem ser objeto de citação em regulamentos técnicos. A ABNT NBR 16.747 foi elaborada pelo Comitê Brasileiro da Construção Civil (ABNT/CB-002), pela Comissão de Estudo Inspeção Predial (CE-002:140.002)

A metodologia, os procedimentos e as etapas abordados neste artigo levarão em consideração as diretrizes estabelecidas pela NBR 16.747, conciliando, quando for o caso, com os preceitos da Norma de Inspeção Predial Nacional do IBAPE.

Definições importantes

Inspeção predial
Processo de avaliação das condições técnicas, de uso, operação, manutenção e funcionalidade da edificação e de seus sistemas e subsistemas construtivos, de forma sistêmica e predominantemente sensorial (na data da vistoria), considerando os requisitos do usuário.
Inspeção predial especializada
Processo de avaliação das condições técnicas, de uso, operação, manutenção e funcionalidade de um sistema ou subsistema específico, normalmente desencadeado pela inspeção predial, de forma a complementar ou aprofundar o diagnóstico.
Vistoria predial
Processo de constatação, no local, predominantemente sensorial, do comportamento em uso da edificação, por ocasião da data da vistoria (diligência). Eventuais falhas, anomalias ou manifestações patológicas que afetam o comportamento em uso (desempenho) da edificação e seus sistemas, elementos e componentes construtivos são registrados durante a vistoria.

Atribuições profissionais

As inspeções prediais devem ser realizadas apenas por profissionais habilitados, devidamente registrados nos conselhos profissionais pertinentes, notadamente o CREA - Conselho Regional de Engenharia e Agronomia ou o CAU - Conselho de Arquitetura e Urbanismo.

Abrangência

De acordo com a NBR 16.747, a abrangência da avaliação de desempenho na inspeção predial deve considerar, no mínimo o seguinte subconjunto de requisitos dos usuários:

  1. segurança
    • segurança estrutural
    • segurança contra incêndio
    • segurança no uso e na operação
  2. habitabilidade
    • estanqueidade
    • saúde, higiene e qualidade do ar
    • funcionalidade e acessibilidade
  3. sustentabilidade
    • durabilidade
    • manutenibilidade

Estes requisitos do usuário correspondem em grande parte aos conjuntos de requisitos da Norma de Desempenho NBR 15.575.

Níveis de inspeção

O intuito da determinação de níveis de inspeção é classificar as edificações por complexidade técnica, consideradas as características técnicas da edificação, manutenção e operação existentes e a necessidade de formação de equipe multidisciplinar ou não para execução dos trabalhos.

A norma do IBAPE Nacional recomenda a seguinte classificação:

  • Nível 1: edificações de baixa complexidade técnica, normalmente com plano de manutenção simples ou inexistente. A inspeção neste nível é realizada normalmente por profissionais de uma especialidade apenas;

  • Nível 2: edificações de média complexidade, com sistemas convencionais e elementos mais complexos. Normalmente empregada em edificações com vários pavimentos, sem plano de manutenção ou com manutenção realizada por pessoal próprio ou empresas terceirizadas. A inspeção neste nível é realizada normalmente por uma equipe técnica formada por profissionais de mais de uma especialidade;

  • Nível 3: edificações de alta complexidade, com sistemas e elementos mais sofisticados. Normalmente empregada em edificações com vários pavimentos e com sistema de manutenção conforme a NBR 5674.

De acordo com a norma, o nível 3 de inspeção pode ser intitulado como auditoria. Todavia, de acordo com GOMIDE, FAGUNDES NETO e GULLO (2009), esta proposição não está correta pois a auditoria possui escopo diferente da inspeção, sendo mais adequado restringir o nível 3 à adoção dos parâmetros definidos no nível 2, acrescidos das análises físico-químicas e outros eventuais indicadores que envolvam a segurança, saúde e melhoria nas condições de habitabilidade.

A NBR 16.747, no entanto, não menciona o conceito de níveis de inspeção, permanecendo o tratado neste tópico como uma referência conceitual.

Etapas da metodologia da inspeção predial

Conforme a NBR 16.747, o processo de inspeção predial envolve as seguintes etapas:

  1. levantamento de dados e documentação;
  2. análise dos dados e documentação solicitados e disponibilizados;
  3. anamnese para a identificação das características construtivas da edificação, como idade, histórico de manutenção, intervenções, reformas e alterações de uso ocorridas;
  4. vistoria da edificação de forma sistêmica, considerando a complexidade das instalações existentes;
  5. classificação das irregularidades constatadas;
  6. recomendação das ações necessárias para restaurar ou preservar o desempenho dos sistemas, subsistemas e elementos construtivos da edificação afetados por falhas de uso, operação ou manutenção, anomalias ou manifestações patológicas constatadas e/ou não conformidade com a documentação analisada (considerando, para tanto, o entendimento dos mecanismos de deterioração atuantes e as possíveis causas das falhas, anomalias e manifestações patológicas);
  7. organização das prioridades, em patamares de urgência, tendo em conta as recomendações apresentadas pelo inspetor predial;
  8. avaliação da manutenção, conforme ABNT NBR 5674;
  9. avaliação do uso;
  10. redação e emissão do laudo técnico de inspeção.

O desenvolvimento das etapas deve ser planejado conforme o tipo de edificação, considerando suas características construtivas, idade, instalações e equipamentos, além da qualidade da documentação entregue pelo responsável pela edificação ao profissional especialista.

Levantamento de dados e documentação

Esta etapa consiste na obtenção e análise de informações sobre a edificação para a definição do nível de inspeção, definição da equipe e dos tópicos a serem inspecionados.

O profissional deve solicitar acesso para consulta aos documentos que devem servir à análise. A listagem dos documentos solicitados deve ser confrontada com a fornecida e esta informação deve ser registrada no laudo técnico de inspeção predial.

A NBR 16.747 recomenda que seja solicitada a seguinte lista de documentos, que deve ser ajustada, reduzida ou complementada pelo profissional em função do tipo e complexidade da edificação e das exigências legais da localidade.

  • Manual de uso, operação e manutenção da edificação;
  • Manual de uso, operação e manutenção de equipamentos instalados;
  • Auto de conclusão (Habite-se);
  • Alvará de funcionamento (para imóveis não residenciais);
  • Alvará de instalação de elevadores;
  • Alvará de funcionamento de elevadores;
  • Auto de vistoria do Corpo de Bombeiros;
  • Projetos legais aprovados;
  • Projeto de segurança contra incêndio aprovado;
  • Projetos exigidos por concessionárias de serviços públicos, aprovados;
  • Projetos Executivos;
  • Regulamento / Regimento Interno;
  • Licenças ambientais;
  • Termos de ajustamento de conduta ambiental;
  • Outorga e licença de poço profundo de captação de água;
  • Outorga e licença de estação de tratamento de efluentes;
  • Cadastro das máquinas e equipamentos instalados na edificação;
  • Atestado de brigada de incêndio (conforme legislação estadual);
  • Relatório de inspeção anual de elevadores;
  • Contrato de manutenção de elevadores e outros meios de transporte (verificar validade);
  • Contrato de manutenção de grupos geradores (verificar validade);
  • Contrato de manutenção de sistemas e instrumentos de prevenção e combate a incêndios (verificar validade);
  • Certificado de teste dos equipamentos de combate a incêndio;
  • Livro de ocorrências da central de alarmes;
  • Certificado de desratização e desinsetização;
  • Plano de manutenção, operação e controle de ambientes climatizados;
  • Avaliação de rede de distribuição interna de gás (a cada 5 anos ou legislação local);
  • Relatórios da realização de serviços de manutenção previstos no manual de uso, operação e manutenção;
  • Relatórios das análises físico-químicas e bacteriológicas de potabilidade de água dos reservatórios e da rede;
  • Relatórios de limpeza e desinfecção dos reservatórios de água;
  • Relatórios de limpeza e manutenção dos poços profundos;
  • Relatório de manutenção da estação de tratamento de efluentes;
  • Relatório de manutenção e limpeza das caixas de inspeção e gordura;
  • Relatório de manutenção da estação de tratamento de água;
  • Relatório do acompanhamento de rotina da manutenção geral;
  • Relatórios dos acompanhamentos das manutenções dos sistemas específicos, como ar condicionado, motores, antenas, bombas, CFTV, equipamentos eletromecânicos e demais componentes;
  • Relatórios de ensaios de água gelada e de condensação de sistemas de ar condicionado central;
  • Relatórios de ensaio de água de reuso (físico-químico e bacteriológicos);
  • Relatórios de ensaios de controle de efluentes tratados;
  • Relatórios de testes de estanqueidade de rede de distribuição interna de gás;
  • Relatórios de ensaios preditivos, como termografia, vibrações mecânicas, etc;
  • Relatórios de manutenção de outros sistemas instalados;
  • Atestado do Sistema de Proteção a Descargas Atmosféricas - SPDA;
  • Relatório de medição ôhmica do aterramento do SPDA.

Análise da documentação

Esta análise tem o objetivo de constatar a adequação da edificação e seus componentes, bem como identificação de deficiências e falhas de manutenção e de uso, entre outras inconformidades técnicas e legais. A análise técnica mais aprofundada, como análise de projetos apresentados, não faz parte do escopo da inspeção.

O profissional deve verificar se os documentos técnicos, em geral, estão devidamente arquivados e em poder do responsável legal, proprietário, síndico ou gestor predial, conforme NBR 5674 e NBR 14.037.

Quaisquer não conformidade e falhas constatadas devem ser relacionadas e descritas no laudo técnico de inspeção predial.

Anamnese

No intuito de conhecer melhor a edificação e instruir o profissional na elaboração da inspeção, as normas recomendam a entrevista prévia com os gestores, funcionários e demais responsáveis pelas edificações antes da vistoria in loco, de forma a obter informações sobre a edificação e seu histórico, como modificações e reformas, bem como para conhecimento da rotina predial, cuidados técnicos e demais procedimentos.

Vistoria da edificação

A finalidade da vistoria é a constatação das anomalias e falhas de manutenção, uso e operação (e de suas eventuais repercussões em termos de sinais e sintomas de deterioração), considerando os requisitos do usuário.

Conforme a NBR 16.747, as vistorias devem considerar:

  • características construtivas;
  • idade das instalações e da construção e vida útil prevista;
  • exposição ambiental da edificação;
  • agentes e processos de degradação atuantes;
  • expectativa sobre o comportamento em uso.

A vistoria deve ser efetuada em todas as áreas comuns e privativas da edificação. As vistorias em área comum devem ser conduzidas pelo responsável da edificação, funcionário ou pessoa autorizada a tal, que conheça e possa mostrar todos os sistemas, equipamentos e componentes a que se possa ter acesso. Por questões legais, as vistorias nas áreas privativas das unidades autônomas só podem ser efetuadas com autorização prévia dos seus proprietários e acompanhadas por estes ou por pessoas autorizadas. O descumprimento dessas duas condições impossibilita a realização da vistoria dentro da unidade, o que pode comprometer o resultado da inspeção. A vistoria nas unidades autônomas é importante, uma vez que a maioria das reformas e modificações das condições iniciais das edificações, bem como grande parte dos problemas, encontram-se dentro das mesmas.

A vistoria se limita às porções visíveis dos sistemas e dos elementos que se tem acesso. Excluem-se da vistoria os sistemas e elementos aos quais não se pode ter acesso, que não estejam visíveis ou que para isto seja necessário mover itens ou obstáculos, que pela avaliação do inspetor não exista condições de segurança para acessá-los, entre outras limitações que possam impedir a sua verificação. Todos os componentes e sistemas que por algum motivo não possam ser verificados, bem como a impossibilidade de vistoria em alguma unidade autônoma, devem ser mencionados no laudo técnico de inspeção predial, com a menção aos motivos.

Roteiro da vistoria

De acordo com a norma do IBAPE Nacional a listagem de verificação a ser utilizada durante a vistoria deve contemplar os principais sistemas, elementos e equipamentos da edificação, conforme a complexidade da mesma e o nível de inspeção, estruturada em um roteiro lógico, que pode ser divididos por área ou sistema da edificação, ou ambos.

Para atender às normas e às legislações que instituem a obrigatoriedade de realização de inspeção predial nas edificações, devem ser avaliados no mínimo os seguintes sistemas e componentes:

  1. Estruturas e fundações;
  2. Vedações;
  3. Revestimentos;
  4. Esquadrias;
  5. Impermeabilização;
  6. Instalações hidráulicas;
  7. Instalações elétricas;
  8. Instalações de gás;
  9. Sistemas eletromecânicos;
  10. Coberturas;
  11. SPDA;
  12. Áreas de lazer;
  13. Sistemas de combate a incêndio.

Esta é uma listagem não exaustiva, e artigos posteriores nesta série podem tratar mais detidamente sobre o roteiro de vistoria predial, além de sistemas, elementos e patologias específicas. Assine nossa newsletter para ser notificado da publicação de material novo.

Classificação das irregularidades constatadas

Após o levantamento das anomalias e falhas presentes na edificação, deve-se fazer a descrição detalhada das mesmas, a fim de caracterizá-las e possibilitar a elaboração de recomendações técnicas. Esta descrição, de acordo com a NBR 5674, deve compreender:

  1. Descrição da degradação de cada sistema, subsistema, elemento ou componente e equipamento da edificação;
  2. Indicação e estimativa da perda do desempenho, sempre que for possível;
  3. Prognóstico de ocorrências.

As irregularidades devem ser classificadas em anomalias ou falhas, considerando os seguintes conceitos, de acordo com a NBR 16747:

  1. Anomalias: se caracterizam pela perda de desempenho de um elemento, subsistema ou sistema construtivo e são ainda divididas em:
    • endógena ou construtiva: quando a perda de desempenho decorre das etapas de projeto e/ou execução;
    • exógena: quando a perda de desempenho relaciona-se a fatores externos à edificação, provocados por terceiros;
    • funcional: quando a perda de desempenho relaciona-se ao envelhecimento natural e consequente término de vida útil.
  2. Falhas: caracterizam-se pela perda de desempenho de um elemento, subsistema ou sistema construtivo decorrentes do uso, operação e manutenção.

Uma vez que a inspeção predial é uma avaliação sensorial pode não ser possível classificar em anomalias e falhas todas as irregularidades constatadas e apontadas no desenvolvimento do trabalho. Além disso, a determinação da origem das anomalias e falhas não faz parte do escopo da inspeção e a falta de elementos necessários para tal faz com que a classificação fique a cargo da subjetividade do inspetor.

Recomenda-se que esta classificação seja feita quando for possível determiná-la, e quando for impossível o profissional deve incluir nas recomendações a análise mais aprofundada e específica da irregularidade indeterminada (GOMIDE; FAGUNDES NETO; GULLO, 2013).

Recomendações técnicas

As recomendações técnicas devem informar as medidas reparadoras necessárias para adequação das inconformidades encontradas, bem como orientações para que sejam realizados ensaios e estudos mais específicos. As recomendações técnicas não devem ser feitas de forma aprofundada. Elas devem ser genéricas e simples para orientar os responsáveis quanto aos serviços que devem ser realizados, pois os serviços de reparo e os projetos técnicos são de responsabilidade dos profissionais e empresas contratadas para a realização dos mesmos, além da prescrição técnica não fazer parte do escopo da inspeção e sim das atividades de consultoria.

Recomenda-se, todavia, indicar manuais, ilustrações e normas pertinentes para facilitar as futuras providências do contratante.

As recomendações técnicas podem indicar a necessidade de contratação adicional de profissional especialista para inspeção predial especializada e/ou serviços técnicos como ensaios e avaliações específicas, para emissão de relatórios e pareceres complementares ao laudo técnico de inspeção predial entregue, especialmente quando as manifestações patológicas não puderem ser classificadas em anomalias ou falhas por prescindirem de análise mais detalhada

De acordo com a norma do IBAPE Nacional, sempre que possível devem ser recomendadas medidas que possam contribuir no âmbito administrativo, da sustentabilidade e também de responsabilidade social, como medidas para economia energética e de água, reciclagem e acessibilidade.

Organização das prioridades em patamares de urgência

A NBR 16747 determina que as recomendações técnicas para correção das anomalias, falhas de uso, operação ou manutenção e/ou não conformidade com a documentação analisada, devem ser organizadas em patamares de urgência, da seguinte forma:

  • prioridade 1: ações necessárias quando a perda de desempenho compromete a saúde e/ou a segurança dos usuários, e/ou a funcionalidade dos sistemas construtivos, com possíveis paralisações, comprometimento de durabilidade, vida útil e/ou aumento expressivo de custo de manutenção e de recuperação. Também devem ser classificadas no patamar “prioridade 1” as ações necessárias quando a perda de desempenho, real ou potencial, pode gerar riscos ao meio ambiente;

  • prioridade 2: ações necessárias quando a perda parcial de desempenho (real ou potencial) tem impacto sobre a funcionalidade da edificação, sem prejuízo à operação direta de sistemas e sem comprometer a saúde e segurança dos usuários;

  • prioridade 3: ações necessárias quando a perda de desempenho (real ou potencial) pode ocasionar pequenos prejuízos à estética ou quando as ações necessárias são atividades programáveis e passíveis de planejamento, além de baixo ou nenhum comprometimento do valor da edificação. Neste caso, as ações podem ser feitas sem urgência porque a perda parcial de desempenho não tem impacto sobre a funcionalidade da edificação, não causa prejuízo à operação direta de sistemas e não compromete a saúde e segurança do usuário

Estes três patamares de urgência determinados pela norma da ABNT coincidem com a classificação em níveis de criticidade recomendada pela norma do IBAPE nacional, com os níveis crítico, médio e mínimo correspondendo aos patamares de prioridade 1, prioridade 2 e prioridade 3, respectivamente.

Avaliação da manutenção e do uso

A avaliação do estado de manutenção e condições de uso devem sempre ser fundamentada, considerando as condições do comportamento em uso dos sistemas, frente às constatações das falhas de uso, operação ou manutenção, confrontando-se as condições previstas em projeto e construção cujos dados estejam disponíveis.

Avaliação da manutenção

Segundo a norma do IBAPE Nacional e a NBR 16.747, para a avaliação da manutenção, o inspetor deve analisar o plano de manutenção, seu efetivo cumprimento e coerência com a idade dos sistemas construtivos inspecionados, as respectivas condições de execução e a sua condição de exposição ambiental, observando o seguinte:

  1. Plano de Manutenção:
    • coerência do plano de manutenção em relação ao que foi recomendado pela construtora e ao que foi especificado por fabricantes de equipamentos e sistemas inspecionados nos respectivos manuais de uso e manutenção, que devem ter sido elaborados em conformidade com a NBR 14037.
    • constatar a efetiva execução das atividades dispostas no plano de manutenção quanto aos procedimentos técnicos, periodicidades e demais recomendações de normas, manuais de fabricantes e outros documentos, tudo com a devida evidência do histórico de manutenção.
    • a frequência e adequação de rotinas à idade das instalações, ao uso, exposição ambiental, entre outros aspectos técnicos que permitam que o profissional habilitado avalie a eficácia do plano de manutenção executado.
  2. Condições de execução das atividades de manutenção:
    • Verificar se existem as condições mínimas necessárias de acesso aos equipamentos sistemas, permitindo a plena realização das atividades propostas no plano de manutenção;
    • Verificar as condições de segurança para o mantenedor e usuários da edificação, durante a execução da manutenção.

Também deve ser observado o atendimento à NBR 5674 no que diz respeito às responsabilidades pela manutenção da edificação

Na ausência de plano de manutenção, a norma do IBAPE Nacional especifica que devem ser analisados os registros de manutenção existentes e comparados com as recomendações dos fabricantes e fornecedores dos equipamentos e sistemas vistoriados.

Após esta análise, o profissional pode classificar as condições de manutenção entre atende, atende parcialmente ou não atende.

Avaliação do uso

A norma do IBAPE Nacional preconiza a análise da adequação das condições de uso da edificação e de seus sistemas conforme ao previsto em projeto e aos níveis de desempenho estimados.

Na ausência de projetos, as normas especificam que a análise deve ser feita com base em parâmetros estabelecidos e/ou recomendados em normas técnicas, instruções técnicas ou leis específicas que contemplem tais sistemas. A eventual inexistência de parâmetros que impossibilitem esta análise deve ser mencionada no laudo.

De acordo com as normas, após a análise o profissional deve classificar as condições de uso da edificação em:

  1. Uso regular: Quando a edificação inspecionada encontra-se ocupada e utilizada de acordo com o uso previsto no projeto;
  2. Uso irregular: Quando a edificação inspecionada encontra-se ocupada e utilizada de forma irregular, com o uso divergente do previsto no projeto.

Laudo técnico de inspeção predial

O laudo técnico de inspeção predial é o documento completo resultante da inspeção realizada, que deve ter, no mínimo, o seguinte conteúdo:

  1. identificação do contratante ou solicitante e responsável legal pela edificação;
  2. descrição técnica da edificação:
    • localização;
    • mês e ano de início de ocupação;
    • tipo de uso;
    • número de edificações (se for um conjunto);
    • número de pavimentos;
    • número de unidades privativas (quando possuir múltiplas unidades);
    • área construída;
    • tipologia dos principais sistemas construtivos;
    • descrição mais detalhada (se necessário);
  3. data das vistorias que compuseram a inspeção;
  4. documentação solicitada e documentação disponibilizada;
  5. análise da documentação disponibilizada;
  6. descrição completa da metodologia da inspeção predial, acompanhada de dados, fotos, croquis, normas ou documentos técnicos utilizados, ou o que for necessário para deixar claro os métodos adotados;
  7. lista dos sistemas, elementos, componentes construtivos e equipamentos inspecionados e não inspecionados;
  8. descrição das anomalias e falhas de uso, operação ou manutenção e não conformidades constatadas nos sistemas construtivos e na documentação analisada, inclusive nos laudos de inspeção predial anteriores;
  9. classificação das irregularidades constatadas;
  10. recomendação das ações necessárias para restaurar ou preservar o desempenho dos sistemas, subsistemas e elementos construtivos da edificação;
  11. organização das prioridades, em patamares de urgência, tendo em conta as recomendações apresentadas pelo inspetor predial;
  12. avaliação da manutenção dos sistemas e equipamentos e das condições de uso da edificação;
  13. conclusões e considerações finais;
  14. encerramento, onde deve constar a seguinte nota obrigatória: “Este laudo foi desenvolvido por solicitação de (nome do contratante) e contempla o parecer técnico do(s) subscritor(es), elaborado com base nos critérios da ABNT NBR 16747”;
  15. data do laudo técnico de inspeção predial;
  16. assinatura do(s) profissional(is) responsável(is), acompanhada do número do respectivo conselho de classe (CAU ou CREA);
  17. Anotação de Responsabilidade Técnica - ART ou Registro de Responsabilidade Técnica - RRT.

Responsabilidades

Os profissionais encarregados pela inspeção predial ficam responsáveis pela realização da mesma segundo o escopo e o nível de inspeção, bem como da observação dos quesitos técnicos e legais relativos às normas e legislações vigentes. O profissional responsável pela inspeção fica eximido de qualquer responsabilidade se não forem implantadas as eventuais medidas corretivas pelos responsáveis das edificações e por anomalias e falhas inerentes à construção, execução e outros de responsabilidade de terceiros.

É de incumbência dos responsáveis pelas edificações a realização das medidas corretivas especificadas no laudo de inspeção predial, contratar profissional ou empresa habilitada para a realização das mesmas e solicitar aos proprietários das unidades privativas os planos e projetos relativos às intervenções realizadas dentro delas.

Conclusão

Neste artigo tratamos das normas técnicas e dos procedimentos passo a passo para elaboração da inspeção predial, uma das principais ferramentas da Engenharia Diagnóstica.

A inspeção predial identifica necessidade de ações corretivas e preventivas, fornece subsídios para implantação do programa de manutenção predial, possibilita a classificação das anomalias e falhas quanto à ordem de prioridade de ações reparadoras, fornece recomendações técnicas quanto à necessidade de correções prevenindo ações corretivas insatisfatórias que necessitarão de retrabalho e possibilitarão o ressurgimento ou agravamento dos problemas e, dentro de certo nível, propicia a manutenção preditiva, uma vez que a inspeção predial poderá fornecer prognóstico de ocorrência de anomalias e também poderá conter sugestão de realização de testes e ensaios tecnológicos para identificação de problemas.

Em textos subsequentes desta série abordaremos aspectos específicos de outras ferramentas diagnósticas e de cada aplicação, detalhando atividades, procedimentos, etapas, metodologia e patologias.

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Principais referências