As leis que constituem o programa Reviver Centro, para recuperação do centro do Rio, foram sancionadas em julho de 2021

Este é nosso quarto artigo da série sobre o Plano urbano Reviver Centro, lançado pela prefeitura do Rio de Janeiro neste início de 2021 com o objetivo de estimular a recuperação social, econômica e urbanística do centro da cidade.

No primeiro artigo trouxemos algumas reflexões a respeito do plano a partir da primeira fase da pesquisa na plataforma de escuta e consulta pública criada pela prefeitura para acompanhamento do plano.

No segundo artigo, tomando como eixo as questões da segunda fase da pesquisa elaboramos um pequeno insight sobre preços de imóveis.

No terceiro artigo apresentamos os principais elementos do Projeto de Lei Complementar nº 11/21 e do Projeto de Lei nº 190/21, que substituíram o primeiro PLC apresentado e naquele momento tramitavam na Câmara Municipal.

Neste artigo apresentaremos a Lei Complementar nº 229/21 e a Lei nº 6.999/21 que foram sancionadas pelo Prefeito Eduardo Paes no último dia 14 de julho, com foco nas diferenças entre a legislação aprovadae e sancioanada e os projetos de lei que lhe deram origem.

Plano Urbano Reviver Centro: Análise da legislação aprovada

Sumário do artigo

Introdução

Como já tratamos no artigo anterior, o Plano Urbano Reviver Centro foi anunciado logo no início de 2021 com o aparente objetivo de ser uma marca importante pra este terceiro mandado do prefeito Eduardo Paes. Em 5 de abril de 2021 o Projeto de Lei Complementar - PLC 08/2021, que instituía o “Programa Reviver Centro” foi encaminhado pelo executivo municipal à Câmara de Vereadores, mas foi retirado de tramitação 4 dais depois por ser inconstitucional, uma vez que o capítulo que tratava dos benefícios fiscais precisaria compor um projeto de lei (ordinária) específico e não poderia estar em meio a um PLC urbanístico.

Então, em 16 de abril de 2021, foram encaminhados, em substituição, o Projeto de Lei Complementar - PLC 11/2021, que institui o Programa Reviver Centro e se concentra nos instrumentos e parâmetros urbanísticos e edilícios, e o Projeto de Lei - PL 190/2021, que complementa o primeiro e trata da concessão de benefícios e isenções fiscais.

Os projetos de lei tramitaram por mais de dois meses na Câmara Municipal do Rio de Janeiro, período no qual foram realizadas pelo menos cinco audiências públicas e doze reuniões entre vereadores e técnicos, além de discussões com representantes da sociedade civil. O PLC 11/2021, dos instrumentos urbanísticos e edilícios, recebeu 126 emendas, das quais 51 foram aprovadas, enquando o PL 190/2021 recebeu 12 emendas e 9 foram aprovadas. A redações finais do PLC 11/2021 e do PL 190/2021 foram aprovadas pelos veredaores nos dias 22 e 23 de junho, respectivamente.

Em 14 de julho de 2021, em cerimônia realizada no Rio Scenarium, no bairro da Lapa, na área central do Rio, o prefeito Eduardo Paes sancionou a legislação aprovada, o PLC 11/2021 se tornou a Lei Complementar - LC 229/2021 e o PL 190/2021 se tornou a Lei - L 6.999/2021.

Na sequência listamos os principais elementos e instrumentos das leis que constituem o Programa Reviver Centro, destancando as diferenças entre os textos aprovados e a versão original dos Projetos de Lei.

Lei Complementar nº 229/2021 - Instrumentos urbanísticos e edilícios

A LC 229/2021 institui o Programa Reviver Centro, que estabelece diretrizes para a requalificação urbana e ambiental, incentivos à conservação e reconversão das edificações existentes e à produção de unidades residenciais na área da II Região Administrativa - II-RA, bairros do centro e Lapa, autoriza a realização de operação interligada e dá outras providências.

Esta Lei Complementar cria incentivos urbanísticos para a construção de moradias e prevê a conversão de edifícios comerciais em residenciais ou de uso misto na região do Centro e da Lapa. Dentre outros incentivos e instrumentos, também são estabelecidos novos padrões construtivos e é implementada a chamada Operação Interligada, a partir da qual empreendedores que executarem novos empreendimentos e projetos de retrofit no Centro poderão se beneficiar da aquisição de potenciais construtivos na Zona Sul, Grande Tijuca e Zona Norte.

Programas e projetos

Além da LC, integram o Programa Reviver Centro os seguintes programas e projetos:

  • Programa de Locação Social;
  • Programa de Moradia Assistida;
  • Programa Esculturas e Arte Urbana;
  • Programa de Conservação Crítica dos Monumentos;
  • Distrito de Baixa Emissão;
  • Distrito de Conhecimento do Centro.
  • Distrito da Vivência e Memória Africana no Rio de Janeiro;
  • Programa de Autogestão.

O Distrito de Vivência e Memória Africana e o Programa de Autogestão não constavam da redação original do Projeto de Lei Complementar e foram acrescentados durante a tramitação na Câmara Municipal.

Benefícios edilícios

Reconversão de edificações para uso residencial e misto

Esta LC estabelece benefícios edilícios no sentido de incentivar que edificações de uso não residencial passem por retrofit e sejam convertidas em edificações residenciais ou mistas.

Poderão receber os benefícios edificações não residenciais ou edificações mistas com predominância de unidades não residenciais que sejam convertidas em edificações residenciais ou edificações mistas com no mínimo 60% da Área Total Construída - ATC composta por unidades residenciais.

Os benefícios edilícios para reconversão de edificações são tratados do art. 4º a 8º da LC 229/2021, dentre os quais destacamos os seguintes:

  • Aproveitamento de volumetria sem restrições quanto a:
    • Área Total Edificável - ATE;
    • Taxa de Ocupação - TO;
    • Vagas mínimas de estacionamento;
    • Dimensões mínimas de circulação;
    • Área útil mínima;
    • Acesso independentes;
    • Instalação de gás;
    • Reservatórios de retardo;
  • Ocupação de área livre do lote além do limite de profundidade fixado por Projeto de Alinhamento - PA;
  • Acréscimo de pavimento acima do último pavimento legalizado, destinado a uso comum.

Novas edificações residenciais e mistas

A Lei Complementar também estabelece benefícios edilícios no sentido de incentivar a produção de novas edificações residenciais ou mistas.

Para usufruir do benefícios as novas edificações deverão possuir “fachada ativa”, através da ocupação da edificação no nível do passeio público por uso não residencial, com acesso direto pela população e abertura para o logradouro e as edificações mistas deverão destinar no mínimo 60% da Área Total Edificável - ATE ao uso residencial.

Os benefícios edilícios para edificações novas são tratados do art. 9º ao 12 da LC 229/2021, dentre os quais destacamos os seguintes:

  • Isenção quanto a:
    • Taxa de Ocupação - TO;
    • Vagas mínimas de estacionamento;
    • Acesso independentes;
  • Ocupação de área livre do lote além do limite de profundidade fixado por Projeto de Alinhamento - PA;

Para as novas edificações que destinem no mínimo 20% de suas unidades por pelo menos 30 anos ao Programa de Locação Social ainda será concedido um acréscimo de 20% na Área Total Edificável - ATE. O texto sancionado acrescenta um parágrafo em que especifica que as unidades a serem destinadas ao Programa de Locação Social serão sorteadas dentre todas as novas unidades da edificação.

Conservação do Patrimônio Cultural

A Lei Complementar também menciona que serão criados benefícios no sentido de incentivar a conservação do patrimônio cultural, mas não os especifica de forma exaustiva.

A LC cita a recuperação morfológica de quadras nas APAC, a criação do Sistema de Escoramento Predial em Imóveis com Risco de Desabamento – SESCORA e a reedição do Programa Pró-APAC e a definição de parâmetros que visem disciplinar a instalação de anúncios e letreiros. O texto sancionado também acrescenta a menção à conservação de fachadas e recuperação de marquises de bares, restaurantes, lanchonetes e congêneres e comércios tradicionais em APAC

O município ainda fica autorizado a realizar limpeza de pichações e iluminação cênica em edifícios privados, além de intervenções e manutenção de arte urbana (estes dois últimos adicionados durante a tramitação do PLC).

Também é criada a possibilidade de que o município “arrecade” imóveis que se encontrem com débitos de IPTU inscritos em dívida ativa e em situação de abandono ou mau estado de conservação por período de cinco anos ou mais.

Os imóveis eventualmente arrecadados serão destinados a:

  • Habitação de interesse social;
  • Prestação de serviços públicos;
  • Fomento da Regularização Fundiária Urbana;
  • Concessão de direito real de uso a entidades civis no interesse do Município;
  • Alienação.

A Lei Complementar ainda proíbe a atividade de estacionamento em imóveis preservados ou tombados e estabelece prazos para que as concessionárias de serviços de telecomunicação e energia elétrica realizem o embutimento do cabeamento aéreo em toda a área abrangida pela LC.

Os incentivos relativos à conservação do patrimônio cultural são tratados do Art. 13 a 20 da LC 229/2021. O Art. 20 foi inserido através de emenda e autoriza a inclusão de outros usos aos clubes “Clube de Regatas Vasco da Gama - Sede do Calabouço”, “Clube de Regatas Boqueirão do Passeio” e “Clube de Natação e Regatas Santa Luzia”, situados no bairro da Glória, destinados a abrigar restaurantes e outras atividades relacionadas a Centro Gastronômico.

Redução do déficit e inadequação Ambiental

São instituídos programas municipais visando a redução do déficit e inadequação habitacional. Aqui o texto sancionado possui duas mudanças sutis e importantes em relação à redação original do PLC: É retirada a menção de que estes programas devem se restringir à área de abrangência da Lei Complementar e é acrescentada a possibilidade de se estabelecer convênios com instituições ou entidades públicas ou privadas sob a fiscalização e controle do Município (além dos governos federal e estadual, já mencionados originalmente).

Estes programas são tratados entre os Art. 22 e 36 da LC e resumidos a seguir.

Assistência técnica e melhorias habitacionais

O Município pode vir a realizar intervenções de recuperação, adequação, conclusão, requalificação e melhoria de habitações individuais e coletivas em imóveis ou áreas ocupadas coletivamente por população carente.

Locação social

A LC 229/2021 institui o Programa de Locação Social, como instrumento integrante da Política Habitacional do Município, em sua área de abrangência.

O texto sancionado acrescenta dois itens à lista de “objetivos” do programa: priorizar o acesso à locação social para a população que trabalha na região central e não reside no centro; e promover a diversidade de acesso a moradia contemplando famílias chefiadas por mulheres, populações negras, indígenas, LGBTQI+ e minorias sociais.

Também foi acrescentado o parágrago 4º ao art. 25, que estabelece que os imóveis próprios municipais, quando inseridos nos programas Reviver Centro e Locação Social, deverão ter ao menos metade de suas unidades enquadradas em programas municipais de oferta de moradia com foco preferencialmente em famílias com renda de zero a três salários mínimos.

São elegíveis ao Programa de Locação Social:

  • Trabalhadores de famílias elegíveis aos programas de habitação do Governo Federal, com renda mensal bruta familiar até seis salários mínimos;
  • Estudantes de cursos técnicos e universitários de instituições públicas ou privadas, com prioridade para os cotistas e os oriundos de famílias elegíveis a programas de habitação do Governo Federal;
  • Servidores públicos com renda mensal bruta familiar de até seis salários mínimos.

Os subsídios de locação poderão ser implementados mediante desconto no preço do aluguel de imóvel pertencente ao Município, repasse ao locatário social ou repasse ao locador.

Moradia assistida

A LC 229/2021 institui o Programa de Moradia Assistida em sua área de abrangência, com o objetivo de oferecer amparo temporário e monitorado para reinserção comunitária de pessoas a partir de transferência de renda para custear o aluguel.

Terão prioridade para integrar o Programa de Moradia Assistida:

  • Pessoas com sessenta e cinco anos ou mais;
  • Pessoas em situação de rua;
  • Pessoas com deficiência;
  • Famílias e indivíduos em situação de vulnerabilidade ou risco social e pessoal;
  • Moradores de áreas de risco, insalubres e de preservação ambiental.

Programa de Autogestão

Também foi acrescentado através de emenda a instituição do Programa de Autogestão, como instrumento integrante da Política Habitacional do Município, com o objetivo estimular a produção social de moradia e estimular formas coletivas de fruição de uso, posse e propriedade de unidades habitacionais.

O Município fica autorizado a realizar editais de chamamento público de entidades sem fins lucrativos para realização de projeto arquitetônico e obra de empreendimento de habitação de interesse social nos próprios municipais destinados à política de HIS ou oriundos da arrecadação a ser realizada pelo Município, de acordo com os princípios estabelecidos pelos instrumentos criados pela própria LC 229/2021. O programa será regulamentado através de ato específico.

Espaços públicos

São instituídas diretrizes para os projetos de reurbanização que venham a ser implementados pelo poder público na área de abrangência da Lei Complementar, tendo por objetivo a caminhabilidade, a qualidade urbano-ambiental e a saúde dos cidadãos, a mobilidade limpa, a integração entre os modais de transporte, a escala humana e a preservação da paisagem cultural. As diretrizes são listadas nos incisos do Art. 38 da LC, dentre as quais resumimos e destacamos as seguintes:

  • Ciclorrotas;
  • Bicicletários públicos;
  • Rotas acessíveis;
  • Jardins de chuva;
  • Banheiros públicos
  • Ordenamento de colocação de mesas e cadeiras;
  • Ordenamento de vendedores ambulantes e revisão de licenças;
  • Ordenamento de bancas de jornal;
  • Ordenamento e padronização de engenhos publicitários;
  • Recuperação e conservação contínua de infraestrutura;
  • Limitação de vagas de estacionamento ao longo dos logradouros;
  • Ordenamento de ações de caridade para oferta de alimentação em espaço público;
  • Estímulo à realização de eventos e instalações temporárias voltadas ao público infantil;
  • Gestão compartilhada através de Parcerias Público-Privadas.

Através de emenda foi acrescentado o inciso XXII ao art. 38, que estabelece como diretriz a expansão das linhas do Veículo Leve Sobre Trilhos - VLT, priorizando os seguintes trechos trechos:

  1. Rodoviária Novo Rio - Leopoldina;
  2. Rodoviária Novo Rio - Terminal BRT Avenida Brasil - São Cristóvão;
  3. Cinelândia - Lapa - Praça Cruz Vermelha.

Também é criado, no Art. 39, o Programa Esculturas e Arte Urbana, que prevê a aquisição e instalação de obras de arte públicas pelo Município, além do estímulo à realização de eventos.

Na redação original do PLC o programa se chamaria apenas “Programa de Esculturas Urbanas” e tratava apenas da instalação de obras de arte “físicas”, já o texto sancionado amplia o escopo do “programa” para incluir o estímulo à realização de eventos culturais em praças e logradouros e cita a linguagem do grafite e da pintura mural como expressões âncora do programa.

O parágrafo que estabelecia que as obras civis privadas e públicas na área de abrangência da LC deveriam destinar 0,5% do valor base utilizado para cálculo do ISS para aquisição de obras de arte públicas a serem instaladas na mesma região foi removido do texto desta Lei Complementar e “transferido” para a outra Lei, dos benefícios fiscais.

Diversidade cultural

Sob o argumento da diversidade cultural é criado o Programa de Conservação Crítica dos Monumentos que tem como objetivos específicos:

  • Adicionar aos monumentos informações interpretativas que situem o personagem ou o fato à luz das correlações de forças políticas, econômicas e históricas à sua época;
  • Ampliar a educação cidadã, especialmente entre crianças e jovens, através da compreensão atual dos fatos históricos da escravidão, eugenia, racismo, violência contra os direitos humanos e opressão da liberdade que atingiram populações negras, indígenas, LGBTQI+ e outras minorias sociais;
  • Propor novos monumentos, sítios e circuitos que celebrem a inclusão dos grupos excluídos e perseguidos historicamente.

Distritos especiais

Distrito de baixa Emissão

É instituído, no Art. 43 da LC, o Distrito de Baixa Emissão do Centro, com o objetivo de implementar ações para redução de emissões de gases de efeito estufa.

Pretende-se que, dentro do Distrito de baixa emissão, seja definida a implantação de uma área de zero emissões de gases de efeito estufa de fontes móveis até o ano de 2030.

O Distrito de baixa emissão é delimitado no anexo I-A da LC e inclui a parte mais adensada e central da área de abrangência da Lei Complementar, vai da Avenida Marechal Floriano até o Passeio Público e do Campo de Santana (excluído) até a Praça XV e Av. Gen. Justo, incluindo ainda metade do bairro da Lapa.

O texto sancionado acrescenta a menção de que o perímetro delimitado neste anexo I-A se configura como uma “área piloto” e os seus limites poderão ser expandidos futuramente para toda a área de abrangência da LC.

A LC 229/2021 não estabelece as condições de implantação do Distrito, que serão regulamentadas por ato do poder executivo.

Distrito do Conhecimento do centro

Também é criado, no Art. 42, o Distrito do Conhecimento do Centro, na forma de um Living Lab (sic), com os seguintes objetivos:

  • Atrair novos negócios dos setores culturais, criativos e de inovação;
  • Evitar a evasão dos negócios dos setores culturais, criativos e de inovação existentes;
  • Estabelecer um ecossistema dinâmico, em que a função residencial do Centro tenha sinergia com as atividades econômicas culturais, criativas e de inovação, promovendo o uso e ocupação de edificações e unidades comerciais com tais atividades.

O Distrito do conhecimento do centro é delimitado no anexo II-A da LC e inclui trechos da área central que possuem uma característica tipológica específica, composta por imóveis em geral menores e mais antigos, tais como a região conhecida como SAARA, a região da Praça Tiradentes, a região da Cruz Vermelha e a maior parte da Lapa.

O art. 48 da Lc estabelece um rol exemplificativo de atividades cuja implantação é objetivo do distrito do conhecimento. O texto sancionado acrescenta três itens a esta lista: editoras e livrarias, espaços de economia circular e afroempreendedorismo.

A LC 229/2021 não estabelece as condições de implantação do Distrito, que serão regulamentadas por ato do poder executivo.

Distrito da Vivência e Memória Africana no Rio de Janeiro

Acrescentado através de emenda, no art. 50 é estabelecida a criação do Distrito da Vivência e Memória Africana no Rio de Janeiro, com os seguintes objetivos:

  • Garantir o reconhecimento e preservação dos espaços vinculados à História, Arqueologia e à cultura africana e afro-brasileira e reestruturação do patrimônio Nacional localizado na região da Pequena África nas políticas urbanísticas da Cidade do Rio de Janeiro;
  • Atrair novos investimentos para os setores culturais, criativos e de inovação social para a área, assim como da manutenção do seu rico patrimônio cultural material e imaterial;
  • Fomentar e promover incentivos para a manutenção dos negócios dos setores culturais, criativos e de inovação existentes;
  • Estabelecer um ecossistema dinâmico, em que a função residencial do Centro tenha sinergia com as atividades econômicas culturais, criativas, de inovação social, respeitando a memória histórica e vocação local, promovendo o uso e ocupação de edificações e unidades comerciais com tais atividades;
  • Incentivar a atividade turística na região, garantindo as condições adequadas de manutenção, preservação, logística, segurança e sinalização dos pontos turísticos locais.

A LC 229/2021 não estabelece nem a delimitação nem as condições de implantação do Distrito, que serão regulamentadas por ato do poder executivo.

Instrumentos de parcelamento, edificação e utilização compulsória

A LC 229/2021 também regulamenta, no âmbito da II-RA, instrumentos de política urbana para gestão do uso e ocupação do solo.

Estes instrumentos são um instituto jurídico-político que permitem ao poder público municipal determinar o parcelamento, edificação ou utilização compulsórios de solo urbano que não esteja edificado ou utilizado, ou que esteja subutilizado, conforme já tratamos neste artigo.

Estes instrumentos são tratados do Art. 55 a 59 da LC.

Operação Interligada

A instituição de Operações interligadas é um dos elementos mais interessantes, complexos e controversos trazidos pelo Programa Reviver Centro

A Operação interligada consiste, em linhas gerais, em conceder determinados benefícios edilícios em imóveis localizados em partes específicas da Área de Planejamento II - AP-II e Área de Planejamento III - AP-III, respectivamente Zona Sul e Zona Norte na cidade, ao proprietário de imóveis na II-RA (área central) que recebam novas edificações residenciais ou mistas ou que tenham edificações não residenciais convertidas em edificações residenciais ou mistas, nos termos desta Lei Complementar.

Os benefícios edilícios aos imóveis desta “área alvo” referem-se à alteração de gabarito, mediante pagamento de contrapartida ao Município, de edificações não afastadas das divisas localizadas nas áreas em que incide o art. 448 da Lei Orgânica do Município do Rio de Janeiro - LOMRJ.

Ou seja, em troca de construções na área central, o mercado imobiliário receberá uma espécie de bônus que permitirá construir acima do gabarito estabelecido em lei em bairros da Zona Sul e da Zona Norte, como Copacabana, Ipanema e Tijuca (área alvo).

Na prática, a proposta prevê que prédios colados às divisas possam ter o mesmo gabarito dos imóveis vizinhos, neutralizando um dispositivo incluído na Lei Orgânica, em 1992, que limita o gabarito desses prédios a 12 metros.

A este respeito, o secretário municipal de Planejamento Urbano, Washington Fajardo, argumenta que a infraestrutura dos bairros da Zona Sul foi planejada pensando em gabaritos mais elevados, e que a Lei Complementar do Programa Reviver Centro não estaria aumentando o gabarito na Zona Sul, mas corrigindo anomalias urbanas que foram criadas com restrições para imóveis colados às divisas.

O prefeito Eduardo Paes afirma que esse já era um caminho que seria tomado pela prefeitura de qualquer forma, mas que, agora, servirá também para ajudar na revitalização do Centro, além de contribuir para o erário.

Os valores arrecadados pelo município através das contrapartidas relativas à adoção da Operação Interligada serão destinados:

  • Ao Fundo Municipal de Desenvolvimento Urbano;
  • À realização de obras de melhoria da infraestrutura urbana e dos espaços públicos na área da II-RA e na AP-III;
  • À aquisição e recuperação de imóveis destinados a programas de habitação de interesse social na área da I-RA e II-RA;
  • À recuperação do patrimônio cultural na área da II-RA.

Emendas aprovadas durante o processo de tramitação incluíram uma série de mudanças e ajustes nos parâmetros da Operação Interligada em relação à redação original do PLC, tais como a exclusão da área da XX-RA das áreas alvo da Operação Interligada, a possibilidade de se juntar direitos de utilização referentes a diferentes imóveis da II-RA em um único imóvel da área alvo e o estabelecimento de um prazo de até 10 anos para o direito de utilização da Operação Interligada.

As alterações mais relevantes do texto sancionado em relação à redação original do PLC foi a ampliação do percentual de desconto que incide sobre a contrapartida a ser paga ao múnicipio para utilização da Operação Interligada, e que varia conforme a localização do empreendimento residencial ou misto na II-RA. No texto original estes descontos variavam entre 15% e 50% e após as mudanças chegam a até 70%.

Os parâmetros para os benefícios, as contrapartidas e os descontos relativos à Operação Interligada, que variam conforme o setor da II-RA, são tratados do Art. 60 ao 65 da LC 229/2021.

Os setores da II-RA para aplicação da Operação Interligada são delimitados no anexo III-A da LC.

Prazo máximo

A LC 229/2021 estabelece um prazo máximo de 120 dias para que o executivo municipal efetue todas as regulamentações necessárias à implementação do Programa Reviver Centro.

Lei nº 6.999/2021 - Benefícios e isenções fiscais

A Lei nº 6.999/2021 concede benefícios fiscais de isenção ou suspensão de IPTU, ISS e ITBI para obras e edificações enquadradas no Programa Reviver Centro de requalificação da região central da cidade.

Foi acrescentado um parágrafo 2º ao art. 2º desta lei que reza que “As obras civis privadas e públicas na área de abrangência desta Lei deverão destinar meio por cento do valor base utilizado para cálculo do ISS para aquisição de obras de arte públicas a serem instaladas na mesma região”. Esta determinação constava originalmente do PLC de instrumentos e benefícios edilícios, mas foi “transferido” para a lei de benefícios fiscais.

Reconversão de edificações para uso residencial e misto

O PL estabelece benefícios e isenções fiscais no sentido de incentivar que edificações de uso não residencial passem por retrofit e sejam convertidas em edificações residenciais ou mistas.

Poderão receber os benefícios fiscais edificações não residenciais ou edificações mistas com predominância de unidades não residenciais que sejam convertidas em edificações residenciais ou edificações mistas com no mínimo 60% da Área Total Edificável - ATE destinada ao uso residencial.

Os benefícios para reconversão de edificações são tratados No art. 4º da L 6.999/2021, os quais resumimos a seguir:

  • Suspensão e posterior remissão dos créditos tributários relativos ao IPTU e à Taxa de Coleta Domiciliar de Lixo - TCL;
  • Redução da alíquota do IPTU em:
    • 100% durante as obras;
    • 50% nos 5 anos seguintes à emissão da certidão de aceitação de obras;
  • Isenção de taxas de licenciamento administrativo das obras;
  • Redução da alíquota do ITBI para os primeiros adquirentes após a reconversão da edificação ou transformação de uso da unidade para:
    • 1% para adquirentes com renda mensal bruta familiar até três salários mínimos;
    • 2% para adquirentes com renda mensal bruta familiar de três a seis salários mínimos.

Novas edificações residenciais e mistas

A Lei também estabelece benefícios e isenções fiscais no sentido de incentivar a produção de novas edificações residenciais ou mistas.

Para usufruir do benefícios fiscais as novas edificações mistas deverão destinar no mínimo 60% da Área Total Edificável - ATE ao uso residencial.

Diferente dos benefícios edilícios, a L 6.999/2021 não estabelece, pelo menos explicitamente, a condição de que as edificações possuam “fachada ativa” para que tenham direito aos benefícios fiscais.

Os benefícios fiscais para edificações novas são tratados no art. 4º da L 6.999/2021, os quais resumimos a seguir:

  • Suspensão e posterior remissão dos créditos tributários relativos ao IPTU e à Taxa de Coleta Domiciliar de Lixo - TCL;
  • Redução da alíquota do IPTU em:
    • 100% durante as obras;
    • 50% nos 5 anos seguintes à emissão da certidão de Habite-se;
  • Isenção de taxas de licenciamento administrativo das obras;
  • Redução da alíquota do ITBI para os primeiros adquirentes após a reconversão da edificação ou transformação de uso da unidade para:
    • 1% para adquirentes com renda mensal bruta familiar até três salários mínimos;
    • 2% para adquirentes com renda mensal bruta familiar de três a seis salários mínimos.

Locação social

As unidades residenciais que forem destinadas ao Programa de Locação Social terão isenção total de IPTU enquanto estiverem vinculadas ao Programa.

Execução de obras em imóveis em péssimo estado de conservação

São estabelecidos benefícios e isenções fiscais no sentido de incentivar a execução e conclusão de obras em imóveis que estejam em péssimo estado de conservação, que não estejam em condições mínimas de segurança, estabilidade, integridade ou habitabilidade (o que deverá ser atestado pela Defesa Civil).

Os benefícios fiscais para obras em imóveis em péssimo estado de conservação são tratados no art. 7º da L 6.999/2021, os quais resumimos a seguir:

  • Suspensão e posterior remissão dos créditos tributários relativos ao IPTU e à Taxa de Coleta Domiciliar de Lixo - TCL;
  • Isenção de IPTU durante toda a obra, prorrogado por três anos a partir do exercício seguinte à emissão da certidão de Habite-se;
  • Isenção de taxas de licenciamento administrativo das obras;
  • Redução da alíquota do ITBI para os primeiros adquirentes após a reconversão da edificação ou transformação de uso da unidade para:
    • 1% para adquirentes com renda mensal bruta familiar até três salários mínimos;
    • 2% para adquirentes com renda mensal bruta familiar de três a seis salários mínimos.

Estes benefícios fiscais se aplicam apenas a edificações, não a unidades autônomas.

Conclusão de obras paralisadas em estágio de estrutura

São estabelecidos benefícios e isenções fiscais no sentido de incentivar a conclusão de obras paralisadas em estágio de estrutura (edificações que possuem oitenta por cento da superestrutura dos pavimentos construída, o que deverá ser atestado pelo Profissional Responsável pela Obra e validade pelo orgão municipal competente).

Os benefícios fiscais para conclusão de obras paralisadas em estágio de estrutura são tratados no art. 9º da L 6.999/2021, os quais resumimos a seguir:

  • Suspensão e posterior remissão dos créditos tributários relativos ao IPTU e à Taxa de Coleta Domiciliar de Lixo - TCL;
  • Isenção de IPTU durante toda a obra até a emissão da certidão de Habite-se;
  • Isenção de taxas de licenciamento administrativo das obras;
  • Redução da alíquota do ITBI para os primeiros adquirentes, quando couber.

Estes benefícios fiscais se aplicam apenas a edificações, não a unidades autônomas e apenas a obras que tenham obtido licença de obras até trinta e seis meses antes da publicação da Lei e que destinem pelo menos 60% da área ao uso residencial.

Condições para a obtenção dos benefícios fiscais

Para concessão dos benefícios fiscais as obras devem atender às seguintes condições::

  • Licença de obras no prazo de até cinco anos a partir da publicação da lei;
  • Certidão de Habite-se ou de Aceitação de Obras no prazo improrrogável de trinta e seis meses, a contar da emissão da licença de obras;
  • Certificado de Adequação emitido pelo órgão de tutela do patrimônio cultural (no caso de imóveis protegidos).

Ainda sem IPTU Progressivo no Tempo

Conforme já mencionado no artigo anterior desta série, uma ausência notável é a instituição do instrumento de política urbana do IPTU Progressivo no Tempo, que não constava de nenhum dos dois projetos de lei. Após a tramitação e as emendas, a redação final da LC 229/2021 e da L 6.999/2021 permanece com esta ausência.

No PLC 08/2021 - o primeiro a ser encaminhando e posteriormente retirado e substituído o IPTU Progressivo no Tempo estava presente, na Seção I do Capítulo VIII, maspor alguma razão o instrumento foi retirado e não retornou mais, o que nos parece uma perda para o programa.

O IPTU progressivo no tempo tem o potencial de constituir-se num poder de dissuasão relevante contra a manutenção de imóveis subutilizados, e poderia ser um elemento catalizador importante, como reforço negativo, em complemento aos benefícios e incentivos, como reforço positivo, à recuperação do centro.

Conclusão

Neste artigo apresentamos de forma resumida e concisa os principais elementos da Lei Complementar nº 229/21 e da Lei nº 6.999/21, que instituem o Programa Reviver Centro. Também apresentamos as principais diferenças entre os textos sancionados e a redação original dos Projetos de lei apresentados no artigo anterior desta série.

Pretendo abordar ainda diferentes aspectos do plano Reviver Centro aqui no blog Inteligência Urbana, conforme novas informações forem sendo reveladas e as medidas sejam implantadas. Se tiver interesse, acompanhe.

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Principais referências